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Na madrugada dessa quarta-feira (30), logo após a decisão da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) de descriminalizar o aborto no primeiro trimestre da gravidez ao julgar um caso concreto, Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara dos Deputados, anunciou a criação de uma comissão especial para debater o aborto no país.

“Tenho discutido com muitos líderes que, às vezes, o Supremo legisla. Entendemos que isso aconteceu ontem (30), e minha posição é que, toda vez que entendemos que isso acontece, nossa obrigação é responder, por que há uma interferência no Poder Legislativo. A criação da comissão especial é uma resposta dizendo: entendemos que há uma prerrogativa que foi usurpada da Câmara, do Congresso, e vamos cumprir nosso papel”, declarou Maia.

A reportagem ouviu especialistas para explicar melhor essa divisão dos poderes e se a justificativa de Maia tem fundamento. “Essa argumentação (de que o STF estaria legislando) não procede. O Supremo está aplicando uma interpretação da Constituição diante da realidade que lhe foi colocada, como é seu papel fazer”, defende Bruno Burgarelli, professor de direito constitucional da PUC Minas.

O Brasil tem um sistema que coloca a Constituição acima de qualquer outra lei. Apesar de o Código Penal prever como crime a prática do aborto, a Constituição Federal é omissa, segundo especialistas. “Não há nada na Constituição que fale explicitamente sobre isso”, explica Burgarelli. Mas fala sobre outras questões, como o direito à vida e a autonomia da própria vida, e foi com base nesses artigos que o Supremo emitiu sua decisão quanto ao caso”.

Para Burgarelli, o problema está na ineficiência do Congresso. “No poder e na política, não há vazio. Se o Legislativo cumprisse suas tarefas, isso não estaria acontecendo”, critica.

Precedente – A decisão tomada pelo Supremo na terça-feira aplicou-se a um caso concreto, o que não significa que o aborto até a 12ª semana de gestação deixa de ser crime no Brasil. “Nessa ação específica, o que se discutia era se pessoas poderiam ser presas por terem praticado um aborto. Mas, é claro, uma coisa leva à outra, e a decisão gera um precedente, e outros juízes podem se espelhar nela e tomar decisões parecidas”, explica Michael Mohallen, professor de direito constitucional da FGV Direito Rio.

Quanto à comissão que será aberta por Rodrigo Maia, Mohallen explica que ela não terá nenhum efeito sobre a decisão já tomada pelo STF. “É uma comissão com uma função puramente política, para dar vazão à vontade de uma parte do Congresso, da qual Maia faz parte, que é a bancada conservadora. O Congresso quer sinalizar que está atento ao que o Supremo está fazendo, que vai resistir”, diz.

Divisão – O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), discorda do colega da Câmara. “Quando o Congresso tem dificuldade para deliberar sobre tema complexo, não acho ruim que o Supremo delibere”. (Por Raquel Sodré)

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