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Um jovem que sonha em cursar medicina estuda, em média, 12 horas por dia. Abre mão de viagens, baladas e até do convívio familiar. Muitos pais ainda investem mais de R$ 1.500 por mês em cursinhos de alto padrão para aumentar as chances do filho. Mas, se não bastasse o desafio de vencer a maior disputa do ensino superior do Brasil, eles ainda enfrentam uma concorrência desleal e desmedida, que insiste em rondá-los por todos os lados: a fraude nos processos seletivos. Quadrilhas especializadas têm se infiltrado cada vez mais em redes sociais, grupos de WhatsApp e até mesmo dentro de cursinhos e universidades para aliciar alunos dispostos a pagar fortunas por uma vaga.

No mês passado, o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) foi mais uma vez alvo de fraudadores, que conseguiram até acesso ao gabarito antes do início das provas, conforme já foi comprovado pela Polícia Federal (PF). Dez pessoas foram presas até agora, entre elas Sofia Azevedo Macedo, 19, pega com um ponto eletrônico no ouvido no segundo dia de prova, em Belo Horizonte. Em seu depoimento, ela disse que, no cursinho em que estudou, o Bernoulli, na capital, havia gente oferecendo vaga em universidade sem necessidade de prova por R$ 400 mil.

A reportagem esteve em dois dos cursinhos mais caros e procurados por candidatos de medicina na capital, o Bernoulli e o G8, e as frases mais ouvidas sobre as fraudes foram “isso é o que mais acontece”, “já fiquei sabendo”, “já recebi proposta na porta de universidade” ou “um amigo já recebeu mensagens”.

No G8, na Savassi, na região Centro-Sul, um fraudador chegou a se inscrever e participar de uma aula experimental neste ano, pediu para entrar no grupo da turma no WhatsApp, pegou contatos dos alunos e nunca mais apareceu nas aulas. Em compensação, passou a assediar os estudantes com ofertas de compra de vaga em universidade, por R$ 90 mil, e uso de ponto eletrônico durante a prova, por R$ 50 mil.

“A busca por candidatos interessados, em regra, é feita no boca a boca. Um candidato descobre alguém e vai repassando para outro. As tratativas das fraudes são realizadas, em quase sua totalidade, por meio de aplicativos como o WhatsApp e o Telegram, dificultando a ação dos órgãos de controle”, disse o delegado Marcelo Freitas, chefe da PF de Montes Claros, no Norte de Minas, de onde uma das quadrilhas transmitiu os gabaritos do Enem para alunos em várias cidades.

Abordagens – A reportagem teve acesso a algumas das mensagens enviadas pelas quadrilhas (leia na página ao lado), e as negociações são simples e diretas, sem rodeios. Os contatos partem geralmente de DDDs do Rio de Janeiro, com proposta de facilidades para faculdades fluminenses e mineiras.

Na recente edição do Enem, a PF identificou que ao menos 20 alunos em Minas foram assediados com propostas de quadrilhas, sem contar outros possíveis fraudadores e alvos que ainda serão identificados em perícias nos celulares e nos computadores dos grupos. Nesses casos, o valor cobrado variou de R$ 100 mil a R$ 180 mil. “É muito injusto com a gente, que estuda o ano inteiro e tenta passar de forma honesta”, disse uma aluna do Bernoulli, de 18 anos. (Luciene Câmara)

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