No último dia 14, o futuro do processo de cassação do presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), estava confinado nas mãos de uma única pessoa: a deputada federal Tia Eron (PRB-BA), que manteve segredo sobre seu voto no Conselho de Ética até o último minuto.
Vinte dias depois, o efeito da decisão dela em outros membros do colegiado pode anular a votação que recomendou a cassação do mandato do peemedebista.
Em relatório apresentado à Comissão de Constituição e Justiça hoje, o relator do caso, deputado Ronaldo Fonseca (PROS-DF), recomenda que seja anulada a votação do relatório do Conselho de Ética que decidiu pela cassação do mandato do peemedebista.
Motivo: a votação por chamada dos deputados permitiu uma espécie de “efeito manada” entre os membros do conselho.
“Tomando-se os votos um a um, ao invés de colhê-los todos ao mesmo tempo (como é a regra estabelecida pelo Regimento Interno da Câmara dos Deputados), acabou-se por, aparentemente, influenciar o voto de ao menos um parlamentar”, afirma o deputado no parecer.
Ele se refere ao deputado Wladimir Costa (SD-PA) que votou pela cassação embora tenha declarado anteriormente que votaria com Cunha.
A mudança da orientação de Costa se deu depois que Tia Eron (PRB-BA) proferiu seu voto, contrário ao presidente afastado da Câmara. O placar final ficou com 11 votos favoráveis à cassação e 9 contra.
“Mudar abruptamente e à mingua de norma legal ou regimental a sistemática de votação representou um prejuízo enorme para o representado, em face do inegável efeito cascata, reconhecido até mesmo pelos seus opositores”, afirma o relator no parecer.
De acordo com Fonseca, a votação do dia 14 de junho deve ser anulada e repetida novamente por meio do sistema eletrônico de votos, seguindo orientação do regimento interno da Casa.
Segundo ele, a ordem dos deputados chamados também foi arbitrária. Em vez de chamar por bloco e ordem alfabética, o presidente do Conselho de Ética deveria ter feito a chamada “alternadamente, do norte para o sul e vice-versa”.
Esse foi o único argumento acolhido por Fonseca de um total de 15 apresentados por Cunha e aliados. O parecer apresentado hoje ainda deve ser votado pelos membros da CCJ. A previsão é de que a análise aconteça somente na próxima semana.
Antes de começar a ler seu voto, Fonseca disse que levou em conta a defesa do “Estado democrático de direito” e que não é papel da CCJ dizer se Cunha recebeu propina em contas no exterior, mas apenas violações no processo. “Sei o quanto serei cobrado pela minha posição, não tenho receio, minhas convicções defenderei sempre”, afirmou.
O QUE PESA CONTRA CUNHA
Com cerca de nove meses de idas e vindas, o processo de cassação de Eduardo Cunha já é o mais longo da história da Câmara. O peemedebista é acusado de mentir à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Petrobras ao afirmar, em depoimento, não ter contas no exterior em seu nome.
As investigações da Lava Jato, no entanto, contrariam a versão apresentada por Cunha. Primeiro político a virar réu no âmbito da operação que apura a corrupção na Petrobras, o peemedebista é acusado de ter recebido, ao menos, 5 milhões de dólares de pagamentos em propina para facilitar dois contratos entre o estaleiro Samsung e a Diretoria Internacional da estatal. (Talita Abrantes – Exame)