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Apesar de defender que a única saída para a crise econômica do país seja um planejamento de austeridade e de corte de gastos, o governo de Michel Temer (PMDB) tem adotado medidas que contradizem o discurso de contenção de despesas públicas.

O aumento dos valores despendidos em publicidade, compras luxuosas, reajustes salariais a servidores e criação de novos cargos comissionados contrasta com o que é pregado pelo Palácio do Planalto.

Segundo estudo da Consultoria de Orçamento da Câmara dos Deputados, as despesas feitas pelo governo federal neste ano serão quase 14% maiores do que os gastos feitos em 2015. No ano passado, os gastos do governo ficaram em R$ 1,05 trilhão. Neste ano, a previsão é que alcancem R$ 1,2 trilhão. A diferença representa aproximadamente R$ 150 bilhões a mais nos gastos pela gestão de Temer.

Buscando uma aprovação e uma confiança maior, a União também ampliou os gastos com publicidade, que, só no primeiro semestre, aumentaram 56% em comparação ao mesmo período de 2015. As despesas na área pularam de R$ 366,5 milhões para R$ 572 milhões.

Para Hélio Berni, economista e professor do Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (Ibmec), o governo não pode se esquecer dos motivos que o levaram a propor a PEC do Teto dos Gastos. “Se o objetivo é controlar o gasto público, não faz sentido aprovar e promover esses aumentos. Para ter apoio, o governo precisa dar demonstrações de austeridade própria. O mercado não vê isso com bons olhos”, conta o economista.

Berni argumenta que o aumento desenfreado de despesas em um período de crise também prejudica a relação com investidores. “Mesmo que este tipo de gasto não tenha a relevância que a PEC propõe, a atitude gera desconfiança nos investidores, em quem pensa em colocar dinheiro no país e gerar emprego”, diz.

A onda de aumentos nos gastos também atinge despesas secundárias. Na semana passada, o Ministério da Educação, por exemplo, divulgou um edital de licitação em que propunha gastar até R$ 198 mil por ano com as refeições do ministro Mendonça Filho (DEM) e de sua equipe enquanto faziam viagens nos aviões da Força Aérea Brasileira (FAB).

A crise econômica também não impediu que representantes do governo no Congresso apoiassem reajustes para categorias. No final de outubro, o bloco governista votou pelo aumento salarial nas carreiras do Judiciário. O impacto deste tipo de aumento pode levar ao acréscimo de gastos públicos de até R$ 2 bilhões.

Para o cientista político Paulo Roberto Figueira Leal, professor da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), o aumento nos gastos seria uma “prova” de que a PEC é, na verdade, ideológica, e não uma proposta real pensando no país: “Essa proposta é inteiramente dedicada ao mercado financeiro. Nossos gastos com saúde e educação, por exemplo, são muito menores do que com o pagamento da dívida. A PEC não está preocupada em controlar gastos, e sim em garantir os pagamentos da dívida”.

A própria administração federal não tem dado demonstrações de austeridade no trato com o dinheiro público. Nos últimos quatro meses, os gastos com o cartão corporativo do governo – que totalizam R$ 24 milhões – já superaram o valor total usado no primeiro semestre, de R$ 22 milhões.

A reportagem entrou em contato com o Planalto para questionar a diferença entre o discurso e as ações, mas, até o fechamento desta edição, não houve resposta. Em coletivas anteriores, ministros defenderam que os reajustes e os gastos feitos foram necessários.

No passado, limites foram “enterrados”

Não é a primeira vez que uma administração federal propõe mais rigor nas finanças brasileiras. Hoje principais críticos à PEC do Teto dos Gastos, integrantes das administrações petistas também trilharam caminho semelhante.

Em 2005, o então ministro da Fazenda, Antônio Palocci, hoje preso em Curitiba por conta da Lava Jato, planejou um controle de gastos públicos baseado no Produto Interno Bruto (PIB). Ou seja, quando a economia nacional crescesse, o valor disponível para os investimentos também subiria. Se caísse, o gasto baixaria no mesmo nível.

A proposta enfrentou resistência de movimentos sociais e de boa parte do governo Lula. Coube à então ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, enterrar de vez o plano, que nem sequer deixou o gabinete de Palocci.

Já no início deste ano, Nelson Barbosa, ministro da Fazenda de Dilma, propôs a flexibilização da meta de superávit primário: com uma arrecadação baixa, a meta também seria revista. Em contrapartida, ele defendeu a limitação das despesas nos anos de maior arrecadação.

Sem apoio. As propostas de governos petistas para reduzir gastos sempre encontraram forte resistência por parte de movimentos sociais, tal como vem acontecendo com a PEC do Teto. (Por Lucas Ragazzi)

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