Da cartola de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) já saíram muitas manobras que esticam há meses seu processo de cassação. Nessa quinta-feira (7), surgiu a mais ousada e dura delas: a renúncia ao cargo de presidente da Câmara dos Deputados, da qual já estava afastado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Lida a carta especulada há dias, mas não esperada para essa quinta-feira (7), surgiram enormes dúvidas sobre os impactos que a queda do ex-todo-poderoso da Câmara trará para o Congresso e para o ainda frágil governo Michel Temer (PMDB). Resume-se em uma questão: é o prenúncio do fim de uma crise ou o do início de outra?

Nas próprias reações de deputados da base e da oposição é possível ver que ninguém sabe bem o que esperar dos intensos dias em que a Câmara terá que decidir sobre o recurso de Cunha na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), votar sua cassação em plenário – caso ele seja derrotado no colegiado – e escolher seu sucessor. Tudo comandado pelo errático presidente interino Waldir Maranhão (PP-MA), um antigo aliado de todo mundo, que hoje não sabe ao certo de que lado está.

Governo – Para Michel Temer, a queda de Cunha resolve um problema e cria outro. Se, por um lado, força a retirada da cadeira do maranhense, que tem atrapalhado as votações de interesse do Palácio do Planalto por suas idas e vindas e pela falta de comando, por outro traz para muito perto o risco da implosão da base em uma eleição sem favoritos e sem tempo para articulações. Pelas pretensões já demonstradas por pré-candidatos do centrão criado por Cunha, do grupo formado por DEM, PSDB e PSB e do próprio PMDB, é de se esperar que, nas próximas horas, qualquer movimento do Planalto em favor de um dos três polos possa significar perda de apoio no Congresso.

A se confirmarem as informações de que partiu do governo a maior pressão para a renúncia de Eduardo Cunha, vê-se que Temer resolveu correr o risco. Indicativo forte do caminho escolhido foi dado pelo fato de o deputado ter renunciado justamente horas após o governo perder sua primeira batalha na Câmara, ao ver a urgência do projeto de lei sobre a dívida dos Estados ser rejeitada pela falta de quatro votos. Parte da responsabilidade foi atribuída justamente a Maranhão, que anunciou recesso na semana e, quando mudou sua decisão, já tinha feito com que muitos parlamentares deixassem Brasília. Com isso, o governo perdeu a disputa que dava como fácil.

Incansável – Para Eduardo Cunha, um incansável na arte de manobrar para manter-se livre das implicações da Lava Jato, a saída é desesperada, mas estratégica. O peemedebista estaria alinhavando, em troca da renúncia, um acordo para obter os votos de que ainda precisa para fazer valer seu recurso na CCJ. Por meio dele, Cunha tenta invalidar a votação do parecer que recomendou sua cassação do cargo, ganhando mais tempo para tentar preservar seu mandato.

Com a saída da presidência anunciada nessa quinta-feira (7), o político fluminense incluiu mais um tópico na discussão. Horas depois da renúncia, ele apresentou um aditamento ao seu pedido no colegiado, alegando que foi julgado como presidente e, como não ocupa mais o cargo, seu processo deveria retornar ao Conselho de Ética pra nova deliberação. O relator do caso na CCJ, Ronaldo Fonseca (PROS-DF), aliado de outros tempos, prometeu avaliar a questão.

Se for derrotado na reunião agora remarcada para terça-feira, Cunha verá seu processo ir ao plenário sabendo que não tem condições de escapar da perda do mandato. Com o voto aberto, já não é mais possível contar com o corporativismo de antigamente.

No plano da Justiça, porém, a decisão tem efeito mais prático. Sem o cargo de presidente da Câmara, Eduardo Cunha deixa de ser julgado pelo plenário do Supremo Tribunal Federal (STF). Suas ações penais, denúncias e inquéritos relacionados à Lava Jato ficarão por conta da Segunda Turma da Corte máxima do Judiciário. No cálculo do deputado federal, há mais chances de escapar das implicações ficando nas mãos apenas de Gilmar Mendes, que comanda o grupo, Celso de Mello, Cármen Lúcia, Dias Toffoli e Teori Zavascki.

Medo do futuro – Ainda que sirva de manobra para driblar as punições cada vez mais próximas, a decisão de Eduardo Cunha de largar o osso da presidência da Câmara acende um alerta para os mais próximos. Mostra que mesmo aquele que desafiou o governo por tantas vezes, deu a largada para o processo que afastou uma presidente da República, refez votações para que prevalecesse sua vontade e comandou com mãos de ferro uma legião de aliados, dispostos a sacrificar a carreira por ele, pode ser obrigado a engolir suas palavras cedo ou tarde. Cunha, que deve ser cassado por mentir sobre contas bancárias em uma CPI, afirmou por meses que não renunciaria. Nessa quinta-feira (7), o fez. Também disse que não iria delatar ninguém. Até quando isso continuará sendo verdade? (Por Ricardo Correa)

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